As Diferenciações Curriculares de Pequeno Porte (Adaptações Não
Significativas) são modificações promovidas no currículo, pelo
professor, de forma a permitir e promover a participação produtiva
dos alunos que apresentam necessidades especiais no processo de
ensino e aprendizagem, na escola regular, juntamente com seus
parceiros coetâneos . São denominadas de Pequeno Porte (Não
Significativas) porque sua implementação encontra-se no âmbito de
responsabilidade e de ação exclusivos do professor, não exigindo
autorização, nem dependendo de ação de qualquer outra instância
superior, nas áreas política, administrativa, e/ou técnica.
Seu
planejamento, assim, deverá considerar a diversidade, estando alerta
para as características individuais. De maneira geral, as Adaptações
de Pequeno Porte podem ocorrer nas mesmas categorias que as
Adaptações de Grande Porte, diferenciando-se principalmente no que
se refere à instância que por elas é responsável.
2- Veja, um
professor não poderá decidir e realizar, por sua própria decisão
e iniciativa, a adaptação de todos os banheiros de uma escola, de
forma que os alunos que se locomovem com cadeiras de rodas possam
deles se utilizar. Obviamente que o professor irá perceber a
necessidade, discutir a organização do espaço e dos aspectos
físicos da sala de aula; a seleção, a adaptação e a utilização
de equipamentos e mobiliários de forma a favorecer a aprendizagem de
todos os alunos; o planejamento das estratégias de ensino que
pretende adotar em função dos objetivos pedagógicos e conseqüentes
conteúdos a serem abordados; a pluralidade metodológica tanto para
o ensino como para a avaliação; a flexibilização da temporalidade
Assim,
nas mesmas áreas poderão se mostrar necessárias tanto Adaptações
de Grande Porte, as quais deverão ser implementadas pelas instâncias
político-administrativas superiores, como Adaptações de Pequeno
Porte, as quais deverão ser implementadas pelos professores de
acordo com suas funções e atribuições formais.
3- Haverá
alunos que necessitarão de Adaptações de Grande Porte em algumas
áreas, e nelas não necessitarão das de Pequeno Porte. Da mesma
forma, haverá alunos que não necessitarão de Adaptações de
Grande Porte, mas que, para usufruir os benefícios da escolaridade,
necessitarão de Adaptações de Pequeno Porte em algumas, ou mesmo
em todas as categorias.
Ajustes
que Cabem ao Professor Realizar
No que
se refere aos ajustes que cabem ao professor desenvolver e
implementar para garantir o acesso do aluno com necessidades
especiais a todas as instâncias do currículo escolar, encontram-se,
de maneira geral: criar condições físicas, ambientais e materiais
para a participação do aluno com necessidades especiais na sala de
aula; favorecer os melhores níveis de comunicação e de interação
do aluno com as pessoas com os quais convive na comunidade escolar;
favorecer a participação do aluno nas atividades escolares; atuar
para a aquisição dos equipamentos e recursos materiais específicos
necessários; adaptar materiais de uso comum em sala de aula; adotar
sistemas alternativos de comunicação, para os alunos impedidos de
comunicação oral, tanto no processo de ensino e aprendizagem como
no processo de avaliação; favorecer a eliminação de sentimentos
de inferioridade, de menos valia, ou de fracasso.
4-
Categorias de Diferenciações Curriculares de Pequeno Porte
Optamos por
apresentar cada categoria, exemplificando, a seguir, alguns dos
ajustes que o professor pode promover para atender a necessidades
especiais de alunos com deficiência.
Diferenciação
de Objetivos : Estas adaptações se referem a ajustes que o
professor pode fazer nos objetivos pedagógicos constantes de seu
plano de ensino de forma a adequá-los às características e
condições do aluno com necessidades educacionais especiais. O
professor pode priorizar determinados objetivos para um aluno, caso
essa seja a forma de atender às suas necessidades educacionais.
Assim, o professor pode investir mais tempo, ou utilizar maior
variedade de estratégias pedagógicas na busca de alcançar
determinados objetivos, em detrimento de outros, menos necessários,
numa escala de prioridade estabelecida a partir da análise do
conhecimento já apreendido pelo aluno, e do grau de importância do
referido objetivo para o seu desenvolvimento e a aprendizagem
significativa do aluno. Como um exemplo desse tipo de adaptação, o
professor poderá priorizar o ensino de formas alternativas de
comunicação para um aluno com paralisia cerebral espástica severa,
impossibilitado de segurar o lápis mesmo quando ele for engrossado
por fita adesiva, em detrimento do ensino da escrita com lápis, em
papel.
5-Um aluno
com paralisia cerebral espástica severa terá enorme dificuldade
para executar os movimentos que são necessários para escrever no
papel. Ficar exigindo dele tais movimentos é não só frustrante e
estressante, como totalmente desnecessário, já que ele pode se
comunicar por outras vias, tais como gestualmente (montando a
mensagem que deseja comunicar por meio da utilização do livro de
signos), por meio da digitação em teclado aumentado de computador,
etc. Escrever, para um aluno com paralisia cerebral espástica
severa, pode ser um objetivo de extrema dificuldade para ser
alcançado; comunicar-se, entretanto, pode ser um objetivo totalmente
viável, desde que o professor encontre a forma adequada para as
características desse aluno, determinantes das necessidades
educacionais especiais.
No caso
de alunos surdos, não oralizados, deve-se considerar a necessidade
de se alterarem objetivos vinculados à oralidade, adequando-os às
formas de comunicação do aluno. O professor poderá também
acrescentar objetivos complementares relacionados aos objetivos
postos para o grupo.
6- Esse
pode ser o caso da ampliação dos componentes curriculares,
procedimento comum no ensino de alunos com deficiência intelectual,
e dos programas de aprofundamento ou de enriquecimento curricular,
propostos para alunos com superdotação.
Diferenciação (adaptação) de Conteúdos : Os tipos de adaptação de conteúdo podem ser a
priorização de tipos de conteúdos, a priorização de áreas ou
unidades de conteúdos, a reformulação da seqüência de conteúdos,
ou ainda, a eliminação de conteú- dos secundários, acompanhando
as adaptações propostas para os objetivos educacionais. Assim, o
conteúdo a ser trabalhado com o aluno será sempre delineado pelos
objetivos postos no plano de ensino. Entretanto, a ordem em que o
conteúdo e suas subdivisões são apresentados, a prioridade que o
professor dará às diferentes unidades, áreas, itens e subitens do
plano de ensino, bem como a ênfase que dará a um item do conteúdo,
em detrimento de outro, é de sua competência decidir, sempre em
função das necessidades especiais presentes.
7-
Diferenciaçãodo Método de Ensino e da Organização Didática
: Adaptar o método de ensino às necessidades de cada aluno é, na
realidade, um procedimento fundamental na atuação profissional de
todo educador, já que o ensino não ocorrerá, de fato, se o
professor não atender ao jeito que cada um tem para aprender.
Faz
parte da tarefa de ensinar procurar as estratégias que melhor
respondam às características e às necessidades peculiares a cada
aluno. Há professores que adotam sempre o mesmo ritual em sala de
aula: ao chegar, fazem a chamada, levam aquele “papo”
introdutório de boas-vindas e de identificação da data e do dia da
semana, recolhem as tarefas, corrigem as tarefas e passam então para
a “apresentação” do novo conteúdo; escrevem a matéria na
lousa, instruindo os alunos para copiá-la. Após terminar a
atividade de passar a matéria começam a ler o que está escrito na
lousa. Após terminada a leitura, muitas vezes tida como explicação,
passam exercícios para os alunos fazerem. Enquanto eles fazem a
atividade, o professor às vezes vai andando pela classe, cuidando
para que a disciplina e o silêncio se mantenham. Após o tempo que
acha adequado, passa à correção dos exercícios, às vezes na
lousa, às vezes individualmente, pedindo a cada aluno que leve seu
caderno até a mesa do professor.
8-Quais os
problemas que você veria neste tipo de procedimento? Certamente está
pensando: Será que ele sabe qual o nível de conhecimento de cada
aluno sobre esse assunto para poder planejar quais os passos a
adotar? Será que ficar copiando um tema da lousa favorece a
aprendizagem? Será que esta seria a única forma de abordar esse
assunto? Ou ainda, será que repetir, em voz alta, o que está
escrito na lousa ajuda a dar significado ao conteúdo focalizado?
Será que o professor não poderia variar um pouco as estratégias de
que se utiliza, em função da natureza dos conteúdos que vai
abordar? Será que uma estratégia única funciona bem com todos os
alunos? Será que ele não poderia adotar estratégias diferentes com
alunos ou grupos que delas necessitassem, de forma que todos os
alunos da classe pudessem ter a mesma oportunidade para apreender o
conhecimento que ele está querendo socializar? Essas, dentre muitas
outras, seriam questões que poderiam muito bem se aplicar à análise
de qualquer processo de ensino. Seriam também questões que podem
sinalizar ajustes que vão se mostrando necessários para atender a
características específicas dos diferentes alunos em seu processo
de apreender e construir conhecimento.
9- Muitas
vezes, para responder efetivamente às necessidades educacionais
especiais de alunos, faz-se necessário modificar nossos
procedimentos de ensino, tanto introduzindo atividades alternativas
às previstas, como introduzindo atividades complementares àquelas
que havíamos originalmente planejado. Assim, por exemplo, ao partir
de um objetivo de ensino “ao final desta aula os alunos deverão
ser capazes de descrever pelo menos três tipos de folhas”, o
professor pode planejar utilizar-se de um álbum de folhas, por meio
do qual possa mostrar para os alunos os tipos que planejou ensinar.
Para alunos com baixa visão, ou para alunos cegos, será certamente
necessário que o professor descreva verbal e minuciosamente as
características de cada folha; pode também ser necessário
favorecer com que eles manipulem folhas, mesmo que feitas em argila,
de forma que possam perceber suas características; já para alunos
surdos, cuja perda auditiva impede a realização de associações e
análises da mesma forma que as pessoas ouvintes, recursos visuais
alternativos devem ser sempre utilizados para que não haja prejuízo
na aprendizagem; assim, o professor pode ter de utilizar textos
escritos, além de mostrar as características do objeto em questão;
pode, também, ter que usar diferentes formas de comunicação, como
por exemplo: gestos, mímica, dramatização, desenhos, ilustrações,
fotografias, recursos tecnológicos (vídeo, TV, retroprojetor,
computador, slides, etc.), leitura labial.
10-Para
alunos com baixa audição, ou para aqueles que utilizam prótese
auditiva (aparelho para ouvir), talvez o professor só precise se
lembrar de checar se o aluno está usando a prótese, se ela se
encontra ligada e adequadamente colocada. Para alunos com grande
dificuldade de abstração, a utilização do material concreto, bem
como a promoção de oportunidades diversificadas de se abordar o
mesmo assunto pode ser importante (exercícios de identificação das
folhas, de associação de idéias, de qualificação das
características); para crianças com dificuldades de atenção
concentrada, usar jogos dos quais elas gostem para introdução e
elaboração de idéias acerca dos diferentes tipos de folha
existentes poderia ser motivador e estimular a atenção necessária
para os detalhes de suas características.
Alunos
com superdotação podem necessitar de oportunidades para desenvolver
estudos de observação, de descrição sistemática e mesmo
experimentos em laboratório focalizando as folhas, sua função
vital, suas propriedades, características, etc.
11- Alunos
com deficiência intelectual podem necessitar tanto de atividades
alternativas às originalmente propostas, como de atividades
complementares. Tais respostas, entretanto, somente poderão ser
adequadas às necessidades dos alunos, se o professor mantiver uma
postura de atenção às peculiaridades que cada um apresenta em seu
processo de aprendizagem. O uso de atividades que impliquem em
diferentes graus de dificuldade pode permitir diferentes
possibilidades de execução e de expressão para alunos com
diferentes níveis de desenvolvimento e de conhecimento.
Outros
ajustes que também podem se mostrar adequados para responder a
necessidades educacionais especiais de alunos são: uso de tipos
variados de atividades, tais como desenvolvimento de pesquisa,
elaboração e desenvolvimento de projeto, oficinas, visitas,
esclarecimento do significado de palavras que lhes sejam
desconhecidas, etc.
12-Uma outra
adaptação no método de ensino é a modificação do nível de
complexidade das atividades. Nem todos os alunos conseguem apreender
um determinado conteúdo se ele não lhe for apresentado passo a
passo, mesmo que o “tamanho” dos passos precise ser diferente de
um aluno para outro. Assim, o professor tanto pode precisar eliminar
componentes da cadeia que constitui a atividade, como dar nova
seqüência à tarefa, dividindo a cadeia em passos menores, com
menor dificuldade entre um e outro, etc.
Outra
categoria de adaptação no método de ensino encontra-se
representada pela Diferenciação de materiais utilizados. São
vários os recursos e materiais que podem ser úteis para atender às
necessidades especiais de vários tipos de deficiência, seja ela
permanente, ou temporária. O professor poderá também ter de fazer
modificações na seleção de materiais que havia inicialmente
previsto em função dos resultados que esteja observando no processo
de aprendizagem do aluno. O ajuste de suas ações pedagógicas tem
sempre de estar atrelado ao processo de aprendizagem do aluno.
13- Diferenciação do Processo de Avaliação : Outra categoria de ajuste que pode
se mostrar necessária para atender a necessidades educacionais
especiais de alunos é a adaptação do processo de avaliação, seja
por meio da modificação de técnicas, como dos instrumentos
utilizados. Alguns exemplos desses ajustes: utilizar diferentes
procedimentos de avaliação, adaptando-os aos diferentes estilos e
possibilidades de expressão dos alunos; possibilitar que o aluno com
severo comprometimento dos movimentos de braços e mãos se utilize
do livro de signos para se comunicar, em vez de exigir dele que
escreva com lápis, ou caneta, em papel; possibilitar que o aluno
cego realize suas avaliações na escrita braile, lendo-as então,
oralmente, ao professor; nas provas escritas do aluno surdo, levar em
consideração o momento do percurso em que ele se encontra, no
processo de aquisição de uma 2a língua, no caso, a língua
portuguesa. Nas etapas iniciais de sua aprendizagem, ela
provavelmente estará muito mais marcada pelas características da
língua de sinais, enquanto que nas etapas finais, estará mais
próxima do português, ainda que com peculiaridades.
14- O
professor, em sua avaliação, deve observar se a mensagem tem
coerência lógica, apresentando um enredo com princípio, meio e
fim, em vez de se ater unicamente à seqüência estrutural das
orações. O professor poderá observar uma estrutura de frase menos
complexa, um menor número de verbos por enunciado, um menor número
de orações e de encadeamento de frases, menos adjetivos, advérbios
e pronomes, com uma maior incidência de palavras significativas.
Poderá
ainda observar um vocabulário mais restrito, tanto no que se refere
ao número de palavras diferentes, como ao número total de palavras
utilizadas. Soma-se a isso uma limitação na complexidade de
relações semânticas apresentadas (objeto, sua localização, a
quem pertence, etc.), sendo mais freqüente o uso de substantivos
significativos e de verbos no presente. Essas características serão
mais acentuadas em alunos que se encontram nas fases mais iniciais da
aprendizagem do português. Sua identificação, entretanto, deve
servir de sinalizador para novos ajustes no planejamento do ensino
para esse aluno. Adaptação na Temporalidade do Processo de Ensino e
Aprendizagem
15-O último
tipo de adaptação que se sugere é a Diferenciação na
temporalidade do processo de ensino e aprendizagem, tanto
aumentando, como diminuindo o tempo previsto para o trato de
determinados objetivos e os conseqüentes conteúdos. O professor
pode organizar o tempo das atividades propostas, levando-se em conta
que atividades exclusivamente verbais tomarão mais tempo de alunos
surdos. Por outro lado, atividades exclusivamente escritas é que
tomarão mais tempo para alunos cegos. Atividades que exigem
abstração, como por exemplo, unidades no estudo da matemática,
demandarão não somente mais tempo, como também maior freqüência
de suporte para os alunos com deficiência mental. Esses foram alguns
exemplos de Adaptações Curriculares de Pequeno Porte, respostas
educacionais que o professor pode e deve dar para favorecer a
aprendizagem dos alunos que apresentarem necessidades educacionais
especiais em sua sala de aula. Eles, entretanto, não esgotam as
necessidades, nem tampouco as possibilidades de ação. O essencial
é: Que o professor esteja constantemente atento a seu aluno, para
identificar de que conhecimentos ele já dispõe (relacionados com o
tema de cada unidade de conteúdo), e que necessidades educacionais
apresenta; Que o professor use de sua criatividade para criar formas
alternativas de ensinar, que respondam às necessidades
identificadas; Que o professor use continuamente da avaliação para
identificar o que precisa ser ajustado no processo de ensinar
16-
Além dessas adaptações de acesso, genéricas, tem-se ainda como
exemplos de adaptações mais específicas:
Para
atender a necessidades especiais comuns em alunos com deficiência
visual
Posicionar o
aluno de forma a favorecer sua possibilidade de ouvir o professor;
dispor o mobiliário da sala de forma a facilitar a locomoção e o
deslocamento do aluno, e evitar acidentes, quando este precisar obter
materiais ou informações do professor; dar explicações verbais
sobre todo o material abordado em sala de aula de maneira visual;
ler, por exemplo, o conteúdo que escreve na lousa; oferecer suporte
físico, verbal e instrucional para a locomoção do aluno, no que se
refere à orientação espacial e à mobilidade; utilizar os recursos
e materiais adaptados disponíveis: pranchas, presilhas para evitar o
deslizamento do papel na carteira, lupa, material didático de tipo
ampliado, livro falado, equipamento de informática, materiais
desportivos como bola de guizo, etc.
17- Para
atender a necessidades especiais comuns em alunos com deficiência
auditiva
Antes
de abordar especificamente a questão da promoção do acesso
educacional, por meio de respostas adequadas para o atendimento das
necessidades especiais mais comuns em alunos surdos, faz-se
necessário relembrar alguns aspectos essenciais de sua educação.
Sabe-se que uma das principais vias de construção de conhecimento
sobre a realidade, de que o homem dispõe, é a interação social,
instância em que a pessoa compartilha experiências lingüísticas,
mais ou menos significativas, por meio das quais apreende o
significado e a função social dos objetos e dos fenômenos sociais.
Ora, o aluno surdo não dispõe da via auditiva para receber e
responder aos estímulos que constituem parte da comunicação
social. Assim, seu acesso ao conhecimento encontra-se intimamente
ligado ao uso comum de um código lingüístico prioritariamente
visual, sem o qual ele fica limitado a acessar somente as
características físicas do objeto e não as conceituais, já que é
na comunicação que o homem é exposto ao conjunto de significados
associado a cada objeto ou fenômeno social.
18- Vamos
pensar, por exemplo, em uma criança que tenha vivido em uma
comunidade que ainda não foi alcançada com os instrumentos da vida
moderna; assim, nunca teve contato com um telefone. Quando, um dia,
por alguma razão, sair da comunidade e for até uma vila ou a uma
cidade, pode ter a oportunidade de encontrar um; pode perguntar a
alguém sobre o que é aquilo, para que serve, como funciona, bem
como pode experimentar usá-lo. Assim, poderá rapidamente
compreender sobre o que é o objeto, para que serve e como
utilizá-lo, mesmo que intensamente surpreendida. Caso essa mesma
criança, entretanto, seja surda e tenha desenvolvido um conjunto de
sinais compartilhado somente por algumas pessoas de sua família, o
processo poderá ser totalmente diferente! Imaginemos que, por alguma
razão, ela tenha saído de sua comunidade pela primeira vez, e tenha
ido à mesma vila com alguém que não conhece bem os sinais
necessários para com ela se comunicar. Ao deparar com o aparelho
telefônico, ele será provavelmente mais um objeto desconhecido para
ela. Deixando de lado os aspectos emocionais que certamente estarão
presentes nessa situação (especialmente pelo contato vulnerável
com uma grande quantidade de coisas por ela desconhecidas),
imaginemos o que o objeto significaria para ela... sua textura, sua
cor, seu tamanho, seu formato, a sensação dele em suas mãos...
mas, como iria apreender para que serve esse objeto? Ela pode até
imitar outras pessoas que tenham usado o telefone e fazer o mesmo
gesto. E daí? Que feedback ela teria para esse gesto? Nenhum, além
da percepção proveniente dos seus órgãos dos sentidos, não é
verdade? Pois então, ela necessitaria da comunicação para poder
apreender e construir conhecimento acerca desse objeto. E assim
seria, com tudo o mais que constitui a realidade em que vive.
19-Por estar
biologicamente impedida de adquirir, de forma natural (sem ensino
sistematizado e formal), a língua portuguesa, a primeira língua da
criança surda torna-se uma língua constituída de sinais,
construída geralmente no ambiente familiar, e muitas vezes somente
nele significativa. É comum sermos informados que “só a mãe é
que consegue falar com ele; só ela é quem entende o que ele está
querendo”. Considerando que toda aprendizagem é mediada pela
linguagem, ela será muito melhor sucedida se a língua utilizada for
compartilhada por todos os que se encontram no processo educacional.
Assim,
aprender a língua portuguesa torna-se importante para o aluno surdo
no Brasil como veículo de acesso ao conhecimento sistematizado,
embora essa não possa ser a única possibilidade a ele oferecida. A
modalidade oral e a modalidade escrita da língua portuguesa devem
ser oferecidas sem serem impostas nem automatizadas, principalmente
durante a educação infantil. Ambas, entretanto, devem ser
oferecidas paralelamente à língua de sinais, configurando uma
educação bilíngüe (caso essa seja a opção dos pais.)
20-Cabe,
entretanto, lembrarmos que se, por algum motivo, o aluno não foi
beneficiado pelo ensino da modalidade oral durante a educação
infantil, e se estiver, principalmente, com defasagem idade/série no
período da alfabetização, deve-se priorizar o uso da língua de
sinais e da língua portuguesa escrita. Não podemos nos esquecer
também de que a língua portuguesa será, para o aluno surdo, uma
segunda língua, como o é para um estrangeiro que venha para o
Brasil, apresentando para ele as dificuldades que são comuns na
aquisição de uma nova língua (como para qualquer outra pessoa...
para você, por exemplo!) No sistema educacional regular, a língua
portuguesa, além de se constituir disciplina do currículo, é o
elemento que organiza e faz a mediação no processo de
desenvolvimento das demais áreas do conhecimento curricular, uma vez
que é nessa língua que o professor faz sua explanação e apresenta
o material gráfico. É necessário destacar que, seja qual for a
área de conhecimento, um texto estará sempre presente no ambiente
educacional, seja ele materializado na forma oral, na forma escrita,
ou na forma sinalizada. Assim, a conversa inicial entre professor e
alunos, a ordem para fazer alguma atividade, o enunciado de operações
e/ou problemas matemáticos, as piadas, a experiência desenvolvida
no laboratório, o livro didático, enfim, inúmeras situa- ções
cotidianas em sala de aula constituem textos significativos,
estruturados na língua portuguesa.
21- O aluno
surdo poderá ter dificuldade de compreensão desses textos, o que
aponta para a necessidade de se utilizar a língua de sinais, ou
outros códigos visuais. A não utilização desses códigos poderá
levá-lo à indiferença, ao isolamento, à agressividade ou ao erro.
É assim que se constrói, muitas vezes, a gradativa exclusão do
aluno surdo, marginalizado por um fracasso que não é dele, mas sim
do contexto que está sendo incapaz de lhe possibilitar o aprendizado
significativo da língua oficial de seu País.
Nem
sempre o método utilizado pelos professores possibilita ao aluno
surdo o acesso às experiências cognitivas do meio acadêmico. É
comum encontrar tentativas de se ensinar a língua portuguesa para
alunos surdos, sem o respeito ao conteúdo vivencial envolvido,
desconsiderando-se seu contexto de produção e reduzindo a língua a
um sistema abstrato, com formas prontas, que se tenta fazer o aluno
assimilar, por meio de “treinos” e repetições.
22- Nesse
sistema, a preocupação maior do professor parece ser apresentar a
estrutura gramatical, garantindo que o aluno unicamente “fixe” a
ordenação e a seqüenciação correta das palavras sem maior
compromisso com o ensino da língua viva, elaborada, criativa e
comunicativa. A língua de sinais organiza as idéias dos surdos de
forma lógica diferente da organização construída por meio do uso
da língua portuguesa. Assim, o surdo acaba produzindo uma estrutura
gramatical diferente, que se reflete nas atividades escritas. Não é
apenas o fato de o surdo não receber informações auditivas que
interfere nas suas práticas lingüístico-discursivas em português,
mas também, o fato de a língua de sinais estar participando
ativamente no processo de elaboração discursiva. Ela, portanto, não
pode ser desconsiderada ao se elaborar qualquer juízo de valor e
critério de avaliação da produção escrita de alunos surdos.
23- O fato
de se chamar a atenção para a consideração desses aspectos
diferenciados nas produções escritas dos surdos não exime o
professor de proceder com as correções necessárias, reforçando o
modelo correto por intermédio de exercícios complementares
significativos, em sala de aula ou extraclasse. A avaliação deve
respeitar o progresso individual, considerando-se sempre o estágio
inicial do processo educativo do aluno surdo. Tendo refletido sobre
essas questões, fundamentais para a compreensão do processo de
aprendizagem do aluno surdo, vamos considerar algumas providências
que podem facilitar seu acesso ao currículo como um todo: apresentar
referências importantes e relevantes sobre um texto (o contexto
histórico, o enredo, os personagens, a localização geográfica, a
biografia do autor, etc.) em língua de sinais, oralmente, ou
utilizando outros recursos, antes de sua leitura; promover a
interpretação de textos por meio de material plástico (desenho,
pintura, murais, etc.) ou de material cênico (dramatização e
mímica); utilizar um sistema alternativo de comunicação adaptado
às possibilidades e necessidades do aluno: língua de sinais,
leitura orofacial, linguagem gestual, etc. posicionar o aluno na sala
de aula de forma que possa ver os movimentos do rosto (orofaciais) do
professor e de seus colegas; utilizar a escrita e outros materiais
visuais para favorecer a apreensão das informações abordadas
verbalmente; utilizar os recursos e materiais adaptados disponíveis:
treinador de fala, tablado, softwares educativos, solicitar que o
aluno use a prótese auditiva, etc.; utilizar textos escritos
complementados com elementos que favoreçam sua compreensão:
linguagem gestual, língua de sinais;
24-Para
atender a necessidades especiais comuns em alunos com deficiência
intelectual
Como é
de conhecimento de todos, a deficiência intelectual não é um
quadro único, padronizado e caracterizado igualmente em todos os
alunos que a apresentam. Geralmente constitui uma dificuldade de
abstração, ou seja, uma dificuldade de operar no nível das idéias,
do raciocínio, sem contar com a presença do estímulo concreto.
Essa dificuldade pode se apresentar em vários níveis, desde as que
se resolvem com algum suporte do professor ou de algum colega, até
as que necessitam de intenso e constante suporte em diferentes
instâncias da vida: pessoal, social, educacional, profissional, etc.
A dificuldade de abstração tem conseqüências práticas
importantes na vida cotidiana da criança, inclusive na própria
aprendizagem do respeito a limites próprios à vida em comunidade.
Tais circunstâncias não podem ser ignoradas pelo professor, já que
dele depende o acesso da criança com deficiência intelectual a
conhecimentos que lhe permitam o desenvolvimento e o exercício da
cidadania e a apreensão do conhecimento produzido e sistematizado
pelo homem.
25- Como
falar de exercício de cidadania para crianças com deficiência
mental/intelectual? Essa é uma questão que freqüentemente circula
nas falas de professores. Nesta conversa perguntaríamos: será que
manifestar as necessidades e desejos não é exercer a cidadania? Não
seria exercício da cidadania escolher o produto que vai adquirir no
supermercado, na quitanda, tomando como base a análise do preço e
da qualidade?
Da
mesma forma, não seria promoção de cidadania: favorecer com que a
criança possa locomover-se com o maior grau de autonomia possível
em sua comunidade? E assim por diante... A escola regular precisa se
organizar para acolher também os alunos com deficiência
mental/intelectual. Além dos ganhos que eles podem obter em seu
processo de desenvolvimento e de construção do conhecimento sobre a
realidade, a convivência com parceiros coetâneos, na diversidade
que constitui a escola, favorece sua socialização.
26-O
processo de apropriação do conhecimento pelo aluno se fundamenta
nos conhecimentos que ele já traz consigo, representados tanto pelos
conceitos cotidianos adquiridos informalmente, como pelos que
adquiriu em sua escolaridade anterior, quando ela ocorreu. Já quando
entra na escola sem ter tido qualquer escolarização anterior traz
consigo conceitos espontâneos, fragmentados, ligados à vida diária.
Tais conceitos devem ser reorganizados e ampliados, com a introdução
dos conhecimentos formais. Assim, faz-se essencial que o professor
adote, como primeiro passo de sua relação com esse aluno (bem como
com qualquer outro), a prática de identificar os conhecimentos que
ele já possui como ponto de partida do processo de ensinar, base
para a ampliação e aquisição de novos conhecimentos, em qualquer
unidade temática.
27- Além
dessa providência, fundamental para a promoção do acesso do aluno
ao conteúdo curricular, há outras mais específicas sugeridas a
seguir: posicionar o aluno de forma que possa obter a atenção do
professor; estimular o desenvolvimento de habilidades de comunicação
interpessoal; identificar e oferecer o suporte de que a criança
necessita para freqüentar, em segurança, os espaços comuns que
constituem a comunidade em que vive; assegurar-lhe conhecimento para
utilização do dinheiro, ou para a busca da ajuda de que necessita
para não ser enganado; estimular o desenvolvimento de habilidades
de autocuidado; estimular a atenção do aluno para as atividades
escolares; estimular a construção de crescente autonomia do aluno,
ensinando-o a pedir as informações de que necessita, a solicitar
ajuda, enfim, a se comunicar com as demais pessoas de forma que estas
sejam informadas de sua necessidade e do que esteja necessitando;
oferecer um ambiente emocionalmente acolhedor para todos os alunos.
28-Para
atender a necessidades especiais comuns em alunos com deficiência
física
A
grande maioria dos alunos com deficiência física apresenta como
necessidade especial para o acesso ao currículo ajustes no ambiente
físico, tais como: utilizar os recursos ou equipamentos disponíveis
que favoreçam a comunicação dos que estiverem impedidos de falar:
sistemas de símbolos (livro de signos, desenhos, elementos
pictográficos, ideográficos e/ou outros, arbitrários, criados pelo
próprio professor juntamente com o aluno, ou criado no ambiente
familiar, etc.), auxílios físicos ou técnicos (tabuleiros de
comunicação, sinalizadores mecânicos, tecnologia de informática);
utilizar textos escritos complementados por material em outras
linguagens e sistemas de comunicação (desenhos, fala, etc.);
posicionar o aluno de forma a facilitar-lhe o deslocamento na sala de
aula, especialmente no caso dos que utilizam cadeiras de rodas,
bengalas, andadores, etc.; utilizar recursos ou equipamentos que
favoreçam a realização das atividades propostas em sala de aula:
pranchas para escrita, presilhas para fixar o papel na carteira,
suporte para lápis (favorecendo a preensão), presilha de braço,
cobertura de teclado, etc.
Alguns
poderão apresentar também uma deficiência intelectual, o que
deverá ser identificado para que as respostas educacionais atendam a
todas as suas necessidades.
29- Para
atender a necessidades especiais comuns em alunos com altas
habilidades (superdotação)
Explicitar
e discutir sobre sentimentos de superioridade, de rejeição dos
demais colegas e de isolamento, favorecendo a instalação de um
clima mais favorável para a ocorrência de interações e o
estabelecimento de relações sociais estáveis; explicitar e
discutir sobre sentimentos de mágoa e comportamentos de esquiva dos
colegas, com o mesmo objetivo do item anterior; estimular o
envolvimento em atividades cooperativas; estimular a persistência na
tarefa; estimular o desenvolvimento de pesquisas.
Bibliografia :
BUENO, José Geraldo Silveira. A educação especial nas Universidades Brasileiras. Brasília: MEC, 2002
GLAT, Rosana; Freitas, Rute Candida de. Questões Atuais em Educação Especial: Sexualidade e Deficiência Mental: Pesquisando, Refletindo e Debatendo sobre o tema. Rio de Janeiro: Sette Lagoas, 1996.
GOLDSTEIN, Sam. Hiperatividade: Como desenvolver a capacidade de atenção da criança. Campinas, SP: Papirus, 1994. (Educação Especial).
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